quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Fernando Pessoa 1888-1935

Túmulo de Fernando Pessoa em Lisboa
Fernando Pessoa













Ânsia do ser



Hoje que a tarde é calma e o céu tranquilo, 
E a noite chega sem que eu saiba bem, 
Quero considerar-me e ver aquilo
Que sou, e o que sou o que é que tem.


Olho por todo o meu passado e vejo
Que fui quem foi aquilo em torno meu,
Salvo o que o vago e incógnito desejo
De ser eu mesmo de meu ser me deu.


Como a páginas já relidas, vergo
Minha atenção sobre quem fui de mim,
E  nada de verdade em mim albergo
Salvo um ânsia sem princípio ou fim.


Como alguém distraído na viagem,
Segui por dois caminhos par a par.
Fui com o mundo, parte da paisagem;
Comigo fui, sem ver nem recordar.


Chegado aqui, onde hoje estou, conheço
Que sou diverso no que informe estou.
No meu proprio caminho me atravesso.
Não conheço quem fui no que hoje sou.


Serei eu, porque nada é impossível,
Vários trazidos de outros mundos, e
No mesmo ponto espacial sensível
Que sou eu, sendo eu por 'star aqui?


Serei eu, porque todo o pensamento
Podendo conceber, bem pode ser,
Um dilatado e múmuro momento,
De tempos-seres de quem sou o viver?


DeFernando Pessoa   -   Cancioneiro

2 comentários:

  1. Querida Elô! Sabe, depois de você ele é o meu escritor predileto! Linda postagem! E que quadro maravilhoso! É uma pintura? De quem? Não conhecia. Bjs, Vera

    ResponderExcluir
  2. Vera, só voce, que é tão amiga, pra me colocar, loucamente, junto ao F.Pessoa....Como voce sabe, ele é o meu preferido também. Este quadro eu peguei na internet, junto a alguns poemas dele. Descobri quando estava fazendo uma pesquisa: tem muita gente que atribui a ele poemas que são de outros. Tentei salvar a imagem e deu certo. Ando agora fazendo uma grande coleção de imagens para usar aqui como ilustração de textos.
    Beijos e obrigada pelo carinho de sempre,
    Elô

    ResponderExcluir